Na culinária gaúcha, a mescla de muitas culturas, cores e sabores
No Rio Grande do Sul, a influência indígena é marcante no cotidiano e na identidade do gaúcho, desde os hábitos culinários, como o chimarrão, pinhão e churrasco, até a arte e o artesanato, como o trançado em couro, as figuras geométricas e os grafismos que adornam as vestimentas tradicionais do gaúcho. A cozinha gaúcha é uma exuberante matéria de folclore. E a carne ocupando o lugar de honra na mesa em todas as ocasiões, momentos e instantes.
O Rio Grande do Sul é um estado cuja cultura recebeu a forte influência de outros povos, como portugueses, açorianos, uruguaios e argentinos, italianos e alemães. Essa presença é percebida na riqueza da culinária sul-rio-grandense e nos diversos pratos com ovinos e suínos.
Carneiro ensopado com batatas, churrasco de carne de carneiro, linguiça com arroz, fritada de linguiça, linguiça ensopada com abóbora, morcilha preta frita, linguiça ou salsichão e filé de porco com batata com doce. Pratos com carne de lebre e coelho são opções especiais.
INFLUÊNCIA INDÍGENA – Antigamente, o atual território do Rio Grande do Sul era habitado pelos índios Guaranis, que viviam da caça e da pesca. Ocupavam as margens da lagoa dos Patos, o litoral norte e as bacias dos rios Jacuí e Ibicuí incluindo a região noroeste; os pampeanos, que ocupavam a região sul e sudoeste e os jês, talvez os mais antigos habitantes no lado oriental do rio Uruguai.
O GADO – Como tentativa de retirar os indígenas da mata para poder catequizá-los, os jesuítas introduziram o gado no Estado. Os índios, então, passaram a tomar conta do rebanho, que era criado solto, e a comer sua carne. Em troca, aprendiam com os jesuítas a cultura europeia e construíam casas, surgindo assim as Missões.
Com a entrada dos tropeiros de São Paulo e Minas Gerais no Sul, os índios foram presos e levados como escravos e os jesuítas voltaram para a Europa. O gado, como era criado solto, continuou a se reproduzir e se espalhar pelo sul do continente, pois não havia um predador para caçá-lo.
O CHARQUE – Quando voltaram para o Rio Grande do Sul, os tropeiros começaram a matar o gado selvagem e a extrair dele o couro cru, que era levado e vendido em outros Estados. Para conservar a carne que sobrava e usá-la como alimento nas longas viagens, os tropeiros começaram a conservá-la com sal grosso para desidratá-la, surgindo assim o charque.
CULINÁRIA ALEMÃ – A cozinha alemã veio a enriquecer o menu gaúcho de várias formas e maneiras nos restaurantes, bares, cafés coloniais e kerbes: o chucrute, o pé de porco, o repolho, as batatas, a couve, e uma infinidade de pratos à base de porco. O café colonial tornou-se uma celebridade teuto-gaúcha, com tortas, geleias, pães, frios, biscoitos, doces, frutas etc.
A variedade dos envinagrados que vão do pepino as cenouras e mil coisas diferentes: os ovos duros, os pratos frios e a comida com doce; e a bebida predominando a cerveja, o chopp e os aperitivos como o underberg, o trigo, a cachaça e os vinhos brancos doces.
PRESENÇA MARCANTE – A partir de 1824, imigrantes alemães fixaram-se na Região Sul do Brasil instalando-se em pequenas propriedades rurais e diversificando a economia brasileira de então. No começo, os alemães ocuparam a região do Vale dos Sinos. Após a Guerra dos Farrapos, foram fundando colônias nas margens de alguns rios, passando a plantar alimentos até então não cultivados no Brasil, como a batata e a produzir comidas influenciadas por seus costumes.
Eles foram os responsáveis pelo início da produção do queijo colonial, famoso na região da Serra Gaúcha, e da chimia, doce pastoso feito tradicionalmente à base de batata-doce e melaço, além de introduzir comidas típicas de sua cultura, como o Eisbein (joelho de porco cozido), o Apfelstrudel (folheado de maçã), as cucas, o chucrute (Sauerkraut) e os embutidos artesanais (salsichas, linguiças e salames).
CULINÁRIA ITALIANA – Os italianos introduziram na culinária gaúcha pratos derivados de sua cultura, como as polentas, massas como os tortéis com recheio de moranga e o Galeto ao Primo Canto. A introdução do cultivo de vinho na região tornou a vinicultura o principal produto dos colonos italianos, sendo muito importante para o Rio Grande do Sul.
Na cozinha italiana, o prato principal é a polenta de milho, os galetos que a acompanha, as massas de trigo de todas as qualidades e formas, capeletti e nhoque, sopas, tortéis e o popular Sagu (malaio “sago”), uma fécula de carboidratos (substância amilácea) em forma de grão extraída do interior esponjoso de várias espécies de palmeiras, chamadas popularmente/genericamente de salgueiros ou saguzeiros, sendo utilizada como alimento básico em diferentes lugares no mundo, é também a matéria prima de um mingau e da produção das bolinhas de sagu.
Abundância de salada verde, começando pelo radicci; queijos na massa, nas sopas e na sobremesa. Vinhos, copa, presunto, salame e salamito.
Foi a partir de 1875 que chegaram os primeiros grupos de italianos no Rio Grande do Sul, vindos de Piemonte e Lombardia, e depois do Vêneto, que se instalaram na região da Serra Gaúcha, mais precisamente na região hoje pertencente ao município de Farroupilha.
CHURRASCO OU ESPETO CORRIDO – No estado gaúcho, a carne é assada sobre fogo ou brasa, com a utilização de espetos ou grelhas. O espeto corrido é uma forma de servir as carnes no espeto, na mesa, onde os clientes que escolhem a parte de seu agrado. Outa forma muito conhecida é o costelão, onde faziam um buraco no chão, cravavam a costela em lanças de pau e deixavam assando-a por horas e horas apenas temperada com sal grosso.
ARROZ CARRETEIRO COM CHARQUE OU SOBRA DE CHURRASCO – Hoje o arroz com carne e temperos é um prato nacional, mas teve origem no desenvolvimento do extremo sul do Brasil. Surgiu quando mercadores (carreteiros) atravessavam a região em carretas puxadas por bois e precisam de uma refeição prática que não estragasse rápido.
Charque é a carne desidratada conservada por muito mais tempo por causa do sal grosso ao redor, tem gosto forte semelhante à carne de sol ou seca, mas o preparo é diferente. A carne bovina é desossada, cortada em mantas, coberta de sal e exposta em local ventilado por dias, com trocas frequentes de posição.
Renato Ilha, jornalista (Fenaj 10.300)